* Rodrigo C. A. Lima
A campanha
Veta Dilma, que pede veto total ao novo
Código Florestal, mostra o quanto um tema complexo tratado de forma
genérica e, por vezes, leviana, gera conclusões simplistas e parciais sobre um
assunto tão relevante para toda a sociedade. A linha dos defensores do veto
total é: "Você prefere proteger as florestas ou anistiar ruralistas
desmatadores?"
Políticos,
artistas, professores, empresários e a sociedade como um todo são levados a
acreditar que mudar o Código Florestal será uma catástrofe ambiental, um enorme
retrocesso para o Brasil. Não se espera que todas essas pessoas tenham um
conhecimento profundo sobre o tema, mas quando recebem informações genéricas,
simplistas e, em muitos casos distorcidas, é fácil tomar partido, sem colocar
os desafios em perspectiva.
Como o tema é
sensível, ainda mais na véspera da Rio+20, o apelo para assumir o lado contra
os produtores rurais é atrativo. Ainda mais quando políticos, artistas e
empresários defendem que é melhor seguir a onda do que é vendido como sustentável,
do que se arriscar e entrar num debate denso e sério. É mais fácil. Afinal,
pesquisa DataFolha aponta que 85% dos brasileiros priorizam a proteção
ambiental e 79% são a favor do veto.
É impossível
ir na contramão, ainda mais quando as redes sociais tornaram a campanha Veta
Dilma um sucesso, e quando as ONGs não construtivas promovem campanhas nas ruas
das principais cidades brasileiras. As pessoas são provocadas a assumir um
lado, e é fácil abraçar a "causa da sustentabilidade" em detrimento
de um setor que é tachado de contrário ao desenvolvimento sustentável.
O que ninguém
gosta de falar, no entanto, é que a famigerada pesquisa foi feita com apenas
1.286 pessoas e, pasmem, apenas 6% dos entrevistados disseram que estavam por
dentro das discussões do Código Florestal! Isso significa que 77 pessoas tinham
base para responder a pesquisa. É possível dizer que 0,00041% da população
brasileira representa a visão da nossa sociedade?
É razoável
usar uma pesquisa com uma amostragem pequena e dizer que ela reflete a
sociedade brasileira? Entendo que não, mas na prática ela serve para o
propósito genérico de sustentar uma tese sem entrar nos detalhes, sem gerar um
debate sério.
Concordo
que haverá veto parcial para trazer a regra mínima de recuperação das Áreas de
Preservação Permanente hídricas. O Icone defende a importância dessa
recuperação, mas destaca que é fundamental gerar um debate sobre como criar
incentivos para que a recuperação seja viabilizada. Afinal, o código atual
prevê isso, mas nunca conseguiu viabilizar a recuperação, pois põe todo o ônus
somente sobre o produtor.
O clamor pelo
veto total da presidente Dilma significa que não é preciso reformar o Código
Florestal, uma lei que tem quase 80 anos, e nunca conseguiu resolver a questão
da ocupação de terras no Brasil. Na linha dos argumentos genéricos, é melhor
manter a lei velha, desconectada da realidade do País, e manter quase 90% dos
produtores na ilegalidade. Assim a pressão eterna por políticas ineficientes de
comando e controle terão espaço.
Ora, manter a
lei atual contraria o senso de democracia e o processo legislativo, pois as
últimas alterações do código foram feitas sob a pressão do desmatamento elevado
que assolava o Brasil entre a década de 1980 e o início dos anos 2000. A realidade hoje é
outra. As taxas de desmatamento caem ano-a-ano, e se, todos os atores -
produtores, Estado, órgãos ambientais, madeireiros, indígenas, assentados,
ONGs, sociedade - cumprirem seus papéis diante do novo código aprovado, o
desmatamento cairá ainda mais.
As estimativas apontam que
aproximadamente 90% do desmatamento é ilegal. Com o Cadastro Ambiental Rural o
governo terá condições de controlar desmatamento, separando o ilegal do legal.
Poderá cobrar os produtores que não se regularizarem, aplicando multas, e aí
entra a não anistia! Poderá até mesmo cuidar de questões fundiárias, outro mal
que foi jogado para baixo do tapete, e que precisa ser resolvido imediatamente.
'Veta Dilma'
significa que seria necessário recuperar mais de 100 milhões de hectares de
vegetação nativa. De um lado, isso obrigaria perder áreas produtivas. De outro,
manteria outras florestas desprotegidas, que poderiam ser legalmente
desmatadas. Isso é sustentabilidade? O veto total significa manter uma lei
ineficiente e impossível de ser cumprida. Na visão de quem o defende, esse
caminho parece adequado, pois é bonito ter leis rígidas, mesmo que não possam
ser cumpridas.
Passou da hora
de se fazer política de forma séria. O Brasil do futuro nunca alcançará todas
suas potencialidades se temas como o Código Florestal forem tratados de forma
superficial. Minha aposta é a de que o veto não será total, e o bom senso irá
prevalecer. Nossa presidente tem uma visão profunda sobre os desafios do nosso
País, e saberá tomar uma decisão acertada.
* Rodrigo C. A. Lima é
gerente-geral do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais
(Icone) e pesquisador da Rede de Conhecimento do Agro Brasileiro (RedeAgro).
E.mail: rlima@iconebrasil.org.br
FONTE: Terra Sustentabilidade