FRUTAS DO CERRADO

João Paulo Tadeu Dias1

O Cerrado ocupa uma área de 204,7 milhões de hectares na região central do Brasil, engloba parte dos estados da Bahia, Distrito Federal, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Piauí, São Paulo e Tocantins (IBGE, 2004). É uma das mais ricas savanas do planeta, com um grande número de espécies que só ocorrem nesse bioma. Tanto a flora quanto a fauna possuem uma diversidade enorme. A agricultura, se mal conduzida nos Cerrados pode tornar-se uma grande ameaça, tendo em vista que é uma atividade lucrativa e sua expansão é acelerada (Klink, Machado, 2005). Em trabalho realizado por Sano et al. (2008), aproximadamente 39,5% do Cerrado apresentaram algum tipo de uso agrícola da terra, especialmente com pastagens cultivadas e culturas agrícolas, com 26,5 e 10,5%, respectivamente.

      As frutíferas nativas do Cerrado merecem destaque, apesar de ser uma riqueza pouco conhecida pela população em geral. Constitui uma importante fonte alimentar, nutricional, terapêutica (possuem diversos nutrientes e substâncias benéficas a saúde), fonte de renda e participa da riqueza cultural dos povos tradicionais, em especial, assentados, indígenas e agricultores familiares da região central do Brasil.
Frutíferas, como por exemplo, o pequizeiro, o araticunzeiro, o cajueiro-do-cerrado, a mutambeira e a mama-cadeleira têm importância singular para as comunidades da região. O pequizeiro é uma planta arbórea, da família Caryocaraceae, com cerca de vinte espécies. As folhas são alternas trifoliadas, pecíolo de 5 a 15 cm de comprimento, folíolos largamente elípticos, de 8 a 20 cm de comprimento e 5 a 12 cm de largura, os dois laterais geralmente menores e ligeiramente assimétricos, face inferior cheia de pelos, base subarredondada, margens serreadas ou crenadas e nervação evidente. 
O fruto do pequi (Figura 1) é drupóide, de cor verde, depresso-globoso, com epicarpo (casca) coriáceo-carnoso, contendo de uma a quatro sementes, envolvido pelo mesocarpo (polpa) amarelo-claro, pastoso e oleoso. O comprimento do fruto (caroço) varia de 6 cm a 14 cm e o diâmetro de 6 cm a 10 cm, com massa variando entre 100 g a 300 g. O endocarpo é lenhoso e espinhoso, as sementes são reniformes. Possui sabor e cheiro incomuns, comestível depois de cozida, os caroços e a polpa são levadas ao fogo juntamente com feijão ou arroz, além de ser consumido puro, com farinha ou mesmo, as pessoas gostam de roer diretamente o caroço, o que deverá ser feito com cautela, a fim de não atingir os rígidos e finos espinhos recobertos pela polpa (Vera et al., 2005; Cavalcante, 2010).  
Existem diversas espécies de araticunzeiro, porém em geral é uma pequena árvore de 15 m de altura, com ramificações baixa e folhagem densa. Folhas simples, alternas, verde-escuras e brilhosas na face superior, de até 25 cm de comprimento e oito centímetros de largura. O fruto de uma das espécies encontradas no Cerrado, conhecido popularmente como araticum-cagão (Anonna cacans), apresentado na figura 2 é um sincarpo oviforme ou arredondado, até 26 cm de comprimento e 15 cm de diâmetro, casca verde, ornada de minúsculos apículos carnosos, polpa brancacenta ou amarelada, macio-fibrosa, mucilaginosa, de cheiro ativo, sementes numerosas, com cerca de 1,5 cm, marrom-amareladas. Os frutos são de sabor bem inferior ao da graviola (seu parente próximo), podem geralmente ser consumidos com açúcar (Cavalcante, 2010). Roesler et al. (2007) concluíram que casca de pequi, além da semente e casca de araticum, assim como, outras frutas do Cerrado possuem excelente capacidade de seqüestrar radicais livres, ou seja, atividade antioxidante e que, se houverem estudos adicionais, podem ter potencial aplicação nos setores nutricionais, farmacêuticos e  cosméticos.
O cajueiro (Anacardium humile) é um arbusto ou pequena árvore de 3 a 8 m de altura e, quando adulto o tronco torna-se inclinado, com ramos irregulares e alguns chegando a rastejar e enraizar no solo. As folhas são alternas, simples, coriáceas, de 6 a 25 cm de comprimento e 5 a 15 cm de largura. O fruto (castanha) é um aquênio reniforme, de 3 a 5 cm, com mesocarpo resinoso, preso a um pedúnculo espessado e carnoso (pseudofruto, a parte comestível) de cor amarela ou vermelha e tamanho variado (Figura 3). O tradicional é o consumo da castanha assada e salgada, assim como do pseudofruto em forma de suco natural, além de ser processado na forma de concentrados, desidratados, doces cristalizados, vinhos e destilados (Cavalcante, 2010).
A mutambeira (Guazuma ulmifolia) é uma árvore de 8 a 16 m de altura, caule de coloração verde-escura e folhas pecioladas, com nervura principal e secundária, limbo com margem dentada. O fruto (Figura 4) é uma cápsula loculicida globoso, de coloração preta, com faixas estreitas e superfície muricada. Semente de coloração acinzentada e formas variadas, envolta pela testa que quando umedecida torna-se gelatinosa. Planta frutífera utilizada para recuperação de áreas degradadas (Lorenzi, 2002; Paiva Sobrinho; Siqueira, 2008).
A mama-cadela ou algodãozinho (Brosimum gaudichaudii) é uma espécie arbórea que ocorre nos Cerrados e Cerradões do Brasil. Os frutos são do tipo drupa, reunidos em infrutescência globosa, amarelo-alaranjada quando madura. A superfície dos frutos é verrucosa com polpa carnosa, sabor adocicado e comestível, enquanto que as sementes são de coloração creme, podendo haver de uma a duas sementes por fruto. 
        A mama-cadela é empregada no consumo de fruta fresca, madeira e celulose na construção civil ou indústria de papel, além de uso medicinal (extraída furanocumarina, substância que provoca a repigmentação das áreas da pele afetadas pelo vitiligo). As raízes são utilizadas como diurético, no tratamento de hepatite, como depurativo do sangue e para a desintoxicação; a casca da raiz é utilizada como aromatizante e ainda suas folhas (Figura 5) podem fazer parte da dieta de bovinos (Lorenzi, 2002; Lorenzi; Matos 2002; Silva Junior, 2005; Faria et al., 2009).
As frutas do Cerrado têm singular importância na diversidade biológica do bioma, ser fonte de alimentos e de componentes com ações nutricionais e medicinais, além de ser uma alternativa geradora de divisas comerciais para as populações tradicionais da região central do Brasil.

REFERÊNCIAS

CAVALCANTE, P. B. Frutas comestíveis na Amazônia. Paulo B. Cavalcante: texto revisado por Ricardo S. Secco. – 7. Ed. Rev. Atual. – Belém: Museu Paraense Emílio Goeldi, 2010. 282 p.

FARIA, R.A.P.G. et al. Características biométricas e emergência de plântulas de Brosimum gaudichaudii Tréc. oriundas de diferentes procedências do cerrado mato-grossense. Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.11, n.4, p.414-421, 2009.

IBGE. Mapa de biomas do Brasil. Escala 1:5.000.000. Rio de Janeiro: IBGE, 2004. Disponível em: http://www.mma.gov.br/estruturas/sbf_chm_rbbio/_arquivos/mapas_cobertura_vegetal.pdf. Acesso em: 24 out. 2014.

KLINK, C. A.; MACHADO, R. B. A conservação do Cerrado brasileiro. Megadiversidade, v. 1, n. 1., p. 147-155, 2005.

LORENZI, H. Árvores brasileiras: manual de identificação e cultivo de plantas arbóreas nativas do Brasil. 2 ed. Nova Odessa: Instituto Plantarum, 2002. v. 2, 368p.

LORENZI, H.; MATOS, F. J. A. Plantas medicinais no Brasil: nativas e exóticas. Nova Odessa: Plantarum, 2002. 512p.

ROESLER, R. et al. Atividade antioxidante de frutas do cerrado. Ciênc. Tecnol. Aliment., Campinas, v. 27, n.1, p. 53-60, 2007.

SANO, E. E. et al. Mapeamento semidetalhado do uso da terra do Bioma Cerrado. Pesq. agropec. bras., Brasília, v.43, n.1, p.153-156, 2008.

SILVA JUNIOR, M. C. 100 Árvores do Cerrado: guia de campo. Brasília, DF: Sementes do Cerrado. 2005, 278 p.

SILVA, M. R. et al. Caracterização química de frutos nativos do cerrado. Ciência Rural, v.38, n.6, p. 1790-1793, 2008.

PAIVA SOBRINHO, S.; SIQUEIRA, A. G. Caracterização morfológia de frutos, sementes, plântulas e plantas jovens de mutamba (Guazuma ulmifolia Lam. – Sterculiaceae). Revista Brasileira de Sementes, v. 30, n. 1, p.114-120, 2008.

SOUZA, C. D.; FELFILI, J. M. Uso de plantas medicinais na região de Alto Paraíso de Goiás, GO, Brasil. Acta botanica brasilica, v. 20, n.1, p. 135-142. 2006.

VERA, R. et al. Caracterização física de frutos de pequizeiro (Caryocar brasiliense Camb.) no estado de Goiás. Pesquisa Agropecuária Tropical, v. 35, n. 2, p. 71-79, 2005.

¹Doutor em Agronomia (Horticultura), Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat), Br 158, Km 655 - Antiga FAB - Nova Xavantina - MT. CEP 78690-000 Caixa postal 08, contato: diasagro2@gmail.com

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