No dia 5 de
março, cerca de mil mulheres militantes do MST ocuparam um centro de pesquisa
da empresa Futuragene, em Itapetininga (SP), destruindo um importante banco
genético. Um trabalho de nove anos e todo o investimento acabou sendo perdido,
em protesto contra o cultivo de eucaliptos transgênicos no Brasil. Ao mesmo
tempo, em Brasília, aproximadamente 200 pessoas invadiram a reunião da CTNBio
(Comissão Técnica Nacional de Biossegurança), da qual Hilton Thadeu Zarate
Couto, professor do Departamento de Ciências Florestais, da Escola Superior de
Agricultura “Luiz de Queiroz” (USP/ESALQ) é membro.
No
encontro, discutia-se a liberação do eucalipto transgênico desenvolvido pela
Futuragene, processo do qual Hilton Thadeu é relator. “A CTNBio é uma comissão
composta de 27 membros, pesquisadores de várias instituições do Brasil,
representantes da sociedade civil e ministérios. As reuniões têm como objetivo
avaliar os processos de produção de material transgênico e, após a liberação, a
Comissão estabelece normas de acompanhamento”, explica Couto.
Segundo o
docente, a questão do eucalipto transgênico, que tem sido criticada,
principalmente por organizações do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
(MST) e merece alguns esclarecimentos. “A empresa terá que fornecer informações
do que está acontecendo com esse material e onde ele está sendo plantado, até a
liberação total. O material e o ambiente de plantio serão também monitorados
por cerca de cinco anos e, durante esse período, a sugestão da CTNBio é que não
se plante mais do que 2 ou 3% da área de efetivo plantio da empresa para termos
a certeza de que ele não trará nenhum problema ao ambiente”, complementa.
Em relação à
falta de água, que é apontada como consequência da plantação deste eucalipto, o
professor da ESALQ afirma que, ao contrário do que as pessoas dizem, ele não
some com a água. “Em seu ciclo, ele faz com que a água vá para a atmosfera e,
com as chuvas, para os rios, abastecendo os mananciais. A crise hídrica não é,
com certeza, resultado do plantio de eucalipto”.
Outro ponto
refutado pelo professor Hilton Thadeu é o argumento do fluxo gênico. “As
organizações contrárias afirmam, de forma incorreta, que o pólen do eucalipto
transgênico pode percorrer longas distâncias e contaminar outros eucaliptos. No
entanto, estudos comprovaram que, a partir de 600 m de distância, não
existe mais possibilidade de transmissão. Além disso, ocorre que hoje, no
Brasil, 99% dos plantios não são por semente. Não se colhe a semente para
plantar eucalipto. Plantamos clones, ou seja, materiais que não são oriundos de
sementes, mas sim de propagação vegetativa. Então não justificaria esse
argumento de que vamos usar a semente do eucalipto que pode estar contaminada
com o pólen transgênico”, reforça. “Se quisermos que não haja contaminação,
basta não plantar o transgênico a menos de 600 m dos eucaliptos não
transgênicos”.
Thadeu contou
que há também a opinião de que a proteína contida no eucalipto transgênico pode
causar efeitos maléficos ao organismo humano e explicou a situação. “Existem
duas proteínas na produção do transgênico, a Cel1, que tem por função alongar a
parede celular, aumentando o crescimento das plantas, mas que realiza sua
função e desaparece, e a NPT II, que caracteriza a planta como transgênica,
permanece na planta e é muito conhecida por aparecer no algodão, no milho e na
soja, por exemplo. Há um estudo (FUCHS et al, de 1993) que avaliou essa
proteína e mostra que ela é rapidamente degradada quando entra no trato
digestivo de mamíferos, como os humanos. E a agência de proteção ambiental e o
ministério de agricultura dos EUA consideram a NPTII segura para consumo
humano. Além disso, é encontrada em quantidades muito pequenas”, explicou.
A presença da
proteína NPTII é apontada pelos grupos que combatem o eucalipto transgênico
como contaminante do mel, fazendo com que o Brasil perca competitividade na
exportação e produção do produto. De acordo com o profissional, a quantidade de
material transgênico no mel depende da quantidade de pólen que ele tem, porque
é o único elemento que pode conter material transgênico, trazido com o néctar
pelas abelhas. “Mas a exigência da exportação é que o mel seja filtrado para
retirar as impurezas, como pernas de abelha, resíduos de própolis e uma série
de contaminantes. Ao filtrar, o pólen e o material transgênico são retirados ou
se deixa uma quantidade muito pequena, como por exemplo, de 3,9 nanogramas por
grama de mel.” Em relação ao mel orgânico, que também poderia ser afetado,
Thadeu afirmou que existe um instituto denominado Instituto Biodinâmico, localizado
em Botucatu (SP), que permite até 5% de material não-orgânico no mel orgânico.
“Mas, ainda assim, o NPTII se degrada no trato intestinal, não causando danos
ao organismo humano”.
Além disso, o
Conselho de Manejo Florestal (FSC), que certifica plantações florestais no
mundo todo, ainda não aprovou a certificação de material transgênico no Brasil,
e esse é um dos motivos que faz com que os manifestantes refutem a liberação do
plantio e comercialização do eucalipto transgênico. “A maioria dos membros desse
órgão é de pessoas oriundas de países que tem uma economia dependente da
produção florestal e que competem com o Brasil, que tem como produtividade
média 40m3/ha/ano nas plantações de eucaliptos. Além disso, o órgão é
financiado por doações as quais não são declaradas as fontes. Pode ser que
receba de organismos que protegem suas produções florestais, dessas regiões que
dependem muito disso e que tem produtividade inferior à nossa. Agora, sem
nenhuma justificativa, são contra o plantio de material transgênico. Acredito
que seja porque é um outro patamar para o desenvolvimento florestal brasileiro,
que tem agora o primeiro eucalipto transgênico do mundo”.
Segundo o
professor, a certificação é importante, pois abre mercados internacionais e dá
mais reconhecimento ao produto exportado, mas não é uma preocupação latente no
momento. “O selo de certificação é exigido apenas por alguns nichos específicos
de mercado, como a Alemanha. Mas a empresa não vai produzir 100% de transgênico
já, e sim 2 ou 3%. É um processo lento e ainda não há produção, só plantios
experimentais”.
A CTNBio dará
continuidade a suas ações, com o apoio do Ministério de Ciência e Tecnologia.
Se acontecer, a liberação plantios comerciais do eucalipto transgênico será
apenas para a empresa, que produziu o primeiro transgênico de eucalipto e está
desenvolvendo-a desde 2006. Se outra empresa desenvolver novos transgênicos,
outro processo será aberto.
FONTE: Alessandra
Postali e Caio Albuquerque – ESALQ/USP