Ribeiro e José Rocher
Uma soja importada da Argentina há quatro anos está provocando transformações drásticas em campos brasileiros. Conhecida no meio rural como a soja de crescimento indeterminado, a tecnologia parece ter chegado para ficar no Brasil. Mais de dois terços da área do país estariam plantadas com essa variedade, conforme especialistas, e a tendência é que conquiste 100% do terreno nos próximos anos. A preferência pela semente se deve ao potencial de recuperação das plantas mesmo depois de um período de seca.
“Tivemos 52 dias sem chuva aqui, que pegaram a fase de reprodução. Teoricamente os produtores não deveriam colher nada, mas no fim acredito que a média da região vai fechar em mais de 20 sacas por hectare”, relata impressionado Enoir Cristiano Pellizzaro, supervisor de campo experimental da C.Vale em Palotina (Oeste).
O técnico, que monitora diariamente as lavouras da região, revela que no ano passado a produtividade média dos produtores locais foi de 65 sacas por hectare. Na avaliação dele, 95% da área do município foi plantada com a soja de crescimento indeterminado, contra 5% em 2002/03.
Mas, não é só o Paraná que tem apostado na soja de crescimento indeterminado. No Centro-Oeste do país, os agricultores também se mostram inclinados ao cultivo da nova tecnologia. As vagens pequenas que crescem no topo das plantas podem fazer a diferença nas lavouras de José Sebastião Fernandes, de Itaquaraí, Mato Grosso do Sul. “A chuva chegou aos 45 minutos do segundo tempo no plantio e, com o investimento que fizemos, podemos colher 55 sacas por hectare”, estima. Ano passado Fernandes alcançou produtividade de 62 sacas por hectare.
O diferencial decisivo da soja indeterminada, no entanto, é que em geral têm ciclo precoce e podem ser colhidas em 110 dias – duas semanas antes da soja de crescimento determinado –, facilitando o plantio do milho de inverno. A expansão dessa tecnologia mais recente deve-se ainda ao formato das plantas, que se assemelham a um pinheiro – estreitas na parte superior e mais largas na inferior.
Desta forma, a penetração dos defensivos se torna mais eficiente, atingido do topo ao pé da soja. A difusão coincidiu com o aumento das aplicações de fungicida no combate à ferrugem asiática, que surgiu no país no início da década passada e foi a principal doença das lavouras na última década.
Diante do novo perfil da safra brasileira, as instituições de pesquisa estão se vendo obrigadas a rever seus estudos e planos. “A preferência dos agricultores mudou abruptamente e nós perdemos mercado na mesma proporção”, afirma Ivo Carraro, presidente executivo da Cooperativa Central de Pesquisa Agrícola (Coodetec). Ao ver sua participação no mercado brasileiro de sementes cair a 5%, a Coodetec decidiu mudar todo o seu banco genético e busca agora reverter o quadro ampliando o portifólio. Para a próxima safra, a Cooperativa pretende lançar pelo menos quatro novas variedades de soja. “Se continuarmos onde estamos não tem como mantermos a pesquisa viável. A nossa meta é crescer entre 1% e 2% ao ano a partir de agora”, revela Carraro.
A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) também está numa encruzilhada. Só com uma participação de 20% do mercado tem como sustentar suas parcerias com a iniciativa privada, explica o dirigente Alexandre Cattelan. “Nem sempre tudo que é bom se vende”, lamenta. A empresa vem se engajando em programas que estimulam a adoção de tecnologias deixadas de lado, incluindo as de soja convencional, de crescimento determinado. “O problema é fazer com que essas tecnologias cheguem lá”, assume Alexandre Cattelan.
FONTE: Gazeta do Povo/Agrolink